CADA VEZ



De Todas As Vezes Que Me Dizes Amo-Te O Teu Olhar Molha-Me De Cores Inventadas

CHÁ DAS CINCO


Ficou presa entre o ritual e o ritmo do relógio de sala. Chá das cinco, Early Grey, bolinhos para companhia. Quente este afecto da chávena na mão ímpar. Verte-se o olhar pelo chá das cinco, debruça-se delicadamente por todos os golinhos engolidos na dobra da hora, vê-se, mira-se na solidão do olhar temperado a gotas de limão, nada adoça o silêncio isolado entre si e nada mais haver, nada mais por beber, nem mesmo outro olhar na ponta da mesa.

A GRANDE VIAGEM

Quanto tempo havía passado? Só o conseguía medir pelos livros gastos sob os olhos da noite, atentos, pisados de tanta insistência em querer andar, saber, conhecer tudo o que conseguisse, viajar mundo fora sem o limte dos pés ou do horário de combóios atrasados.

Deixara-se envelhecer como o amarelo das folhas muito passadas pela ponta dos dedos, o fato a crescer-lhe no definhar do empate corpóreo. Afinal só precisava de se rechear de tudo aquilo que os seus olhos pudessem aprender nas passagens demoradas pelos desertos ou pelos mares descobertos em lambidelas de istmos rochosos, conquistar saberes para os levar quando fizesse a grande viagem. Por fim, cansado, abriu uma caixa de lápis e bebeu todas as cores expostas. Encarou-se, temperado a dois tons de branco e negro. E percebeu que outros tons, outros olhares só noutro sitio, que aqui já soía.

TRUQUES





Aqui é onde os olhos se enganam. Onde tudo é pailletes, lantejoula, brilho e carmim. Onde os olhos parecem abertos e afinal estão pintados de cerrados. Onde o coelho branco é um lenço e a vista acha flores na mão do mágico, na varinha de condão que não passa de uma corda. Cobra. De ver tudo o que não é.


Ou é?


Truques que os olhos pregam...

OUTRO OLHAR

EU TAMBÉM TENHO OLHOS AQUI:


PRIMAVERAS DO OLHAR


O que denomina a beleza de um olhar não é tanto a sua cor ou a maquilhagem cuidada no das mulheres ou o ensaiado no engate dos homens. É muito mais o que ele reflecte enquanto capacidade para enfrentar, fixar e transmitir. É a revelação do que lhe vai por dentro que isto em boa verdade, os olhos mudam de cor e até passam do negro profundo ao azul água sem esquecer que embora não se apercebendo o estado de alma pode muitas das vezes atravessar o ensanguentado vermelho de raiva. Não temer o que traduz um olhar ou encarar o alheio, assumir a sensibilidade de uma água salina ou ainda o cerrar de olhos pelos opostos de beleza e crueldade é sinal de plenitude e sabedoria do próprio, paz interior e partilha de emoções. É por isso que há olhares que nunca esquecemos e que mesmo vincados pelos sinais do tempo a sua frescura nos lembra uma manhã de Primavera.

CUBRO-ME

ESCONDO OS OLHOS

NÃO TAPO O QUE DÓI

OLHAR O TEMPO

Por vezes abría a janela do passado e deixava-se ficar a olhar para ele, muito calado, silencioso no temor de despertar recordações que lhe fizessem reviver amores perdidos e a saudade à solta o capturasse de novo.
De outras, sorría. Olhava-se menino, a achar-se grande no seu tamanho pelos sonhos que já trazía para um futuro que agora é passado. De soslaio mirou planos, quereres fazer, um dia faço, um dia sou, ainda hei-de conseguir...
Encostou as portadas devagar, fechou os olhos e sentiu-se só nesse mergulho no tempo.

ÂMBAR OU OURO?



Cerrou as pálpebras devagar. A luz ambarina dourava-lhe a pele, o cabelo, até mesmo os olhos fechados ao exterior e que agora numa intimidade suprema se abríam ao mundo a descobrir por dentro de si, colecções de lembranças e de outras coisas, tão novas que lhe aceleravam o coração na corrida para elas.


Cerrou as pálpebras devagar. Ficou tonta, até um pouco nauseada pelos sentires que lhe ruborizaram a tez, granadas, rubis, calores que lhe afrontaram lumes no desejo de a olharem. Viu-se. Era de ouro a sensação de leveza que a transportou a outro universo.


Cerrou as pálpebras devagar. Saboreou o tom de mel como dos deuses caído na ponta da lingua sobre segredos que se propagam à orelha do confidente. Atingiu-se, deixou-se segregar naquela luz macia de âmbar ou de ouro, tanto faz, é bela, é q.b.


Sonha.

CONFIDÊNCIAS


Sabes o que é que me apetecía mesmo?
Ficar aqui contigo, trocarmos palavras sem tino, responder a confidências com outras confidências, mostrar-me surpresa quando no final já o sabía, mas assim tem mais charme e depois é bem verdade que nada se iguala ao tom com que mas dizes, que esta coisa de suspeitar é misteriosa é certo, mas até as palavras foram inventadas com este propósito, o da fantasia e tu sabes bem como me derreto com surpresas. Vá, conta mais, basta que me olhes nos olhos.

ESTE É AQUELE



Em que te digo VEM.

FINGE














Se tudo o que sentes é forte e verdadeiro porque escondes o olhar sob a máscara pesada das tintas, mesmo que o coração tão pequenino te traia no rosto, desbotado ao sal das lágrimas que fazes por inverter
no caminho seguro do faz de conta?
É que mesmo fingindo a rosa não deixa de ser vermelha e os teus olhos não se fecham à vida.
Antes se marejam de outros tantos apetites que o teu coração manda.


Libera pois, a tua vontade, o teu sentir, o teu afecto.
A pele agradece, o amor enobrece-se.

MUDO. MUDO???



QUANDO O CINEMA SE FALAVA PELOS OLHOS.


PISCA-ME O OLHO E DIZ-ME QUE ME AMAS...

SEI-O

Fragmento cada frase tirada de ti na imaginação do que gostaría me dissesses. No fundo calas tudo, mas só o calas porque a intenção está lá. Os teus olhos dizem-mo. E mesmo que um dia a voz inflame nada será novo para mim. Sei de cor o texto, sei de que cor é o teu olhar.

ORIGINAL


O negativo de mim está perdido, foi-se, não há mais.
Restou o original, sem mais cópia, decalque, transfusão, um único exemplar sem direito a errata ou condensado, resumo ou compilação.
Tudo o que vejo é original, são nos meus olhos que levo todas as cores, pintar quando daqui partir um novo mundo de faz de conta.
...Faz de conta que é original, o negativo perdeu-se, foi-se...

O QUE SE É/O QUE SE VÊ


A brisa veio empurrar docemente as janelas entreabertas. Arejou-se nos cantos do quarto, acomodou-se pelos cortinados, soprou-lhe no cabelo molhado segredos que parecíam cócegas.
Na tranquilidade daquele silêncio tudo parecía estar certo, arrumado, o mundo no seu lugar e no entanto, essa serenidade calada lembrava-lhe a solidão de cada manhã em que ao olhar-se no espelho não vía a figura dele reflectida, o cachimbo fumegando entre letras de jornais devoradas a pé, de um lado para o outro.
Vía-se a si e ao quarto. Não vía as brisas acomodadas a perturbarem-lhe o pensamento mas sentía que daquilo que vía da sua silhueta não era o que lhe corría por dentro. É que nas suas veias passavam-lhe memórias de calor de mãos, troca de olhares, murmurios não percebidos na intenção da pergunta repetida, que dizes, que dizes...
Hoje não diz nada, desembaraça o cabelo molhado e apenas vê uma mulher que não conhece.

NEM TUDO É ÁGUA

Isso! Faz de conta que não sabes, que não vês o que te assusta, o que te empobrece enquanto homem e diviniza na besta!
Isso! Faz de conta que ao lavares o rosto todas as imagens de guerra se limpam dos teus olhos, uma beatitude ao mirares o horizonte!




Isso... faz de conta que aquilo que choras são gotas de água... parecem tão iguais às lágrimas... mas falta-lhes o sal.

AZUIS


Os meus olhos são azuis de tanto te procurar no azul do céu.

IMPRESSÕES


Vá lá um sorriso. Mas ela nada. Nem um músculo se mexia ou mesmo um tremor no canto dos olhos que fizesse prever que a boca se havería de arquear para exibir o leve sorriso.
Vamos, um sorriso só. Mas ela nada. Mantinha os olhos muito abertos para não perder nada do que a rodeava, sempre alerta, sempre defensiva. A qualquer altura sería capaz de correr pela vida, escapar-se aos tiros e às mãos dos homens que a queríam levar para lhe arrancar primeiro o corpo, depois a alma.
Mas tu não ris? Ela nada. Não sabía o que era isso. E se soubesse já lhe tinha esquecido há muito, muito tempo atrás quando lhe havíam arrancado a inocência na infância do olhar.

CRUEL

OLHAR Nº 35

NEM SEQUER OLHO PARA TI...

VIDROS DA ALMA





Saber o que nos magoa e dilacera, faz chorar no sal das lágrimas e nos nós das que entornam no nosso avesso como pedradas em vidros.Transparentes, porque não se vêem.Estilhaçadas, porque quebraram o encanto.

PORQUÊ

Há em mim um desassossego permanente.

Não questiono a vida, pergunto porquê as saudades, a melancolia, o disparatadamente feliz pelo chegar das estações, a loucura do amor nos sorrisos, nos beijos, no olhar que se troca como presentes ávidos, a fome da alma, o sal que as palavras condimentam no rasgar do silêncio ou na chicotada da ofensa.

Tão mais fácil apenas mirar a vida e deixá-la passar. Fechar os olhos à crueldade do mundo dos homens e engolir sob as pálpebras que também eu faço parte dessa horda.

OLHAR O PASSADO



Para onde vais, perguntaram-lhe, para o meu passado respondeu, então voltas para trás, não encontro-me, recuas insistiram, acho-me afirmou com um sorriso.


- Como assim? Se te perdes nas memórias?


Vejo nas minhas lembranças como aprendi a sorrir e a olhar as saudades como se fossem um mar grande onde posso nadar até querer e depois, já cansada, deixar-me levar nas marés das recordações até hoje.

SEM RUMO




Perde-se

Tanto

De nós


Quando

Se perde

O olhar





De outros.

OBJECTIVA


Todo o meu corpo é olhos. Sagazes e famintos de te ver para dentro. Quero engolir-te num relance e demorar o horizonte no olhar molhado.

SEDUÇÃO


Nem era tanto a cor marinha o que me perturbava. Tão pouco sentir-me asfixiar numa água muito diluída daquelas que se vê em postais de férias e que são retocadas à mão para o encanto ser maior. Talvez as pestanas, isso as pestanas muito negras no contraste da luz que saía dos olhos vivos, e baixavam rápido ou lentas e neste último movimento permanecíam, um slow motion lânguido e venenoso que me disparava o coração e me deixava aflita. Ou então eram as sobrancelhas, a esquerda levemente arqueada quase desavergonhadamente perguntava-me queres...
Eu quería, claro que quería mas nunca consegui dizer que quería, sentía-me enfeitiçada pela serpente, quase tinha medo de te olhar nos olhos e caír de roupa aberta para que me tomasses para ti.
Não eram tanto os olhares que cravavas nos meus... era a sedução do que eles me murmuravam.

DAS JANELAS



Das janelas do meu mundo abro o meu coração para quem souber ver para dentro dele.


Há mares, há sóis, há luas e também há tempestades que obrigam a cerrar a vista como se a areia de todos os desertos se revoltasse contra o vento.


Das janelas do meu mundo avistam-se chamas de infernos que ardem na dor da desilusão e da solidão, mas também há lagos que espelham a tranquilidade das palavras quando o poeta delas se acerca.

AUMENTAR

Faço de conta que não vejo...

Só o que é bom.

Aí olho com o peito, o coração.

E vejo melhor, aumentada pela essência de um sorriso.

ENCANTAR


Beija-me os olhos, faz de conta que sou pequenina, beija-me os olhos e faz-me esquecer tudo o que é feio e vil e mesquinho e atraiçoa os homens na pequenez do seu coração.
Beija-me os olhos e sela-me um novo olhar, a esperança de que quando eu crescer tudo será azul e agora, eu já grande esqueço-me, volto a ser menina e a aprender.

TANTO DIZER



Engasgo-me DOLOROSAMENTE nas palavras reprimidas. Sem o som do mar ou o ruído no silêncio do crescer basta-me OLHAR para quebrar amarras. Fotografo imagens do mundo que me rodeia e transformo-o em memórias. ERA UMA VEZ...